quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Não brinquem com Dilma

Uma mulher é presidente no crescente e machista Brasil. E ela não está para brincadeira

Por Mac Margolis (Newsweek, 18/09/2011)*

Das muitas histórias de guerra que Dilma Vana Rousseff fala em sua ascensão de revolucionária para burocrata de carreira até presidente do Brasil, uma em especial merece destaque. Foi no início da corrida para suceder Luiz Inácio Lula da Silva, quando a maioria dos brasileiros estavam acordando para a idéia da vida sem o seu líder hiperpopular, o "pai dos pobres." Um dia, em um aeroporto lotado, uma mulher e sua filha timidamente se aproximaram de Rousseff para olharem mais atentamente a candidata feminina favorita. "Uma mulher pode ser presidente?", quis saber a menina, cujo nome, muito apropriadamente, era Vitória. "Pode", respondeu Dilma. Vitória agradeceu Rousseff, ergueu o queixo e saiu poucos centímetros mais alta.

Dilma sorriu ao lembrar o episódio durante a entrevista à Newsweek, no palácio presidencial de Brasília. Eram cerca de seis horas, e o forte sol do planalto central brasileiro já estava se pondo. Mas o dia de Rousseff estava longe de acabar. Enchentes no sul haviam deixado milhares de desabrigados. O trabalho de construção para a Copa do Mundo, que o Brasil sediará em 2014, estava atrasado. A imprensa ainda repercutia os escândalos de corrupção e as consequências em seu gabinete, que tinham custado cinco de seus ministros em menos de nove meses. E, mesmo assim, Rousseff, em uma jaqueta roxa, calças pretas, e grandes brincos de pérolas, olhava tranquilamente enquanto falava sobre o Brasil, a economia mundial, a pobreza e a corrupção.

Seu cabelo era espesso e brilhante; suas bochechas, rechonchudas, sem nenhum traço de moagem das sessões de quimioterapia a que fora submetida para tratar de um linfoma descoberto em 2009. Por quase uma hora ela falou, com firmeza, sobre diversos pontos. De dados de criação de emprego ("Geramos 1.593.527 nos primeiros seis meses") até como as mulheres podem rescrever as regras de engajamento político, passando por TS Eliot ("Ash Wednesday" é um dos favoritos). "Quando eu era pequena, queria ser bailarina ou bombeira, e ponto", disse. "Eu não sei se é um mundo novo, mas o mundo está mudando. É um sinal de progresso até mesmo uma menina perguntar sobre ser presidente".

Para aqueles que ainda duvidam, a Assembléia Geral da ONU, reunida em Nova York esta semana, é o retrato de uma nova ordem mundial. Hillary Clinton vai estar lá. Do mesmo modo, Angela Merkel, a chanceler alemã cuja palavra pode vir a determinar o destino da fragilizada União Europeia. Talvez ainda mais notável seja o fato de quatro das 20 mulheres chefes de estado hoje (12 dos quais são esperadas na Assembléia) virem das Américas. As outras são Cristina Kirchner, da Argentina; Laura Chinchilla, da Costa Rica; e Kamla Persad-Bissessar, de Trinidad e Tobago. E, em 21 de setembro, quando Rousseff subir à tribuna, ela será a primeira mulher a fazer o discurso de abertura neste mar global de ternos que foi a ONU desde fundada.

O crescimento de Dilma coincide com o do Brasil. Antes um fracassado crônico, hoje o Brasil se encontra em rota ascendente. No ano passado, a economia cresceu 7,5%, o dobro da média mundial. Em 2011, conseguirá um respeitável 3 ou 3,5%. Enquanto as nações mais ricas lutam para evitar uma dupla recessão, o Brasil tenta esfriar a sua economia aquecida. Sua moeda é estável, seu sistema de justiça, mesmo falho e lento, funciona, e seus meios de comunicação estão entre os mais independentes do hemisfério.

Com as nações mais ricas paradas e o mundo árabe em revolta, esta expansiva e democrática nação está rompendo seus limites hemisféricos. Na semana passada, chegou a sugerir a idéia de unificar um pacote de socorro da zona do euro. "Precisamos estudar uma maneira de as nações emergentes com maior poder de fogo ajudarem a Europa", disse o ministro das Finanças de Dilma, Guido Mantega, que se reunirá com companheiros de BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) na reunião anual do FMI- Banco Mundial, em Washington, esta semana. "Em 2008, ajudamos a elevar a capacidade de financiamento do FMI de US$ 250 bilhões a US$ 1 trilhão. Podemos fazer algo assim hoje".

Ninguém espera seriamente que o Brasil salve a Grécia. (A Reuters chamou a oferta de Mantega de um "jogo de poder oco" e uma maneira pouco arriscada de "melhorar o status internacional do Brasil.") Mas quem teria imaginado isso de um país que há 15 anos era um frágil elo na ordem financeira mundial? "Por muito tempo, vocês foram chamados de o país do futuro", disse Barack Obama a um embalado Teatro Municipal, no Rio de Janeiro, em março, citando o velho ditado de que o Brasil era o país do futuro e sempre seria. "O povo do Brasil deve saber que o futuro chegou. Ele está aqui agora. "

*Tradução livre do blog