sábado, 27 de novembro de 2010

A timidez sobe os palcos

Por Murillo Victorazzo (matéria produzida, mas não publicada, na ISTOÉ, 2003)

Eles são famosos, vivem do seu talento e imagem. Dar autógrafos e entrevistas faz parte de seus cotidianos, mas este estilo de vida, que para o público poderia significar o mesmo que ser extrovertido, nem sempre é a realidade. Quando se pensa em tímidos famosos, não há como não lembrar do nome de Paulinho da Viola. Conhecido como o “Príncipe do Samba”, ele é o oposto do artista que lida com a mídia com naturalidade. “Já fui muito mais tímido. Superei a timidez na marra.”, conta.

Paulinho é daquelas pessoas que têm aversão a tumulto. “A última vez que fui à Portela não conseguia falar com ninguém, me senti muito mal.” Sua personalidade se reflete até na preferência de uma samba em ritmo mais lento, o que, aliás, já foi motivo de discussões com sua escola de samba: “Prefiro um samba mais lento. Se o pessoal da Portela diz que assim não dá para para passar o desfile, prefiro nem ir, vou para casa dormir”.

Criado em uma família muito reservada, Paulinho foi educado de forma muito conservadora, o que, segundo ele, incentivou sua timidez. “Fui um menino muito sozinho e era no porão da minha casa onde me sentia mais seguro. Descobri que existe um monte de gente assim, que se esconde em um buraco e fica fantasiando. Gosto de ver uma criança falando sozinha, porque sei que ela está em seu próprio mundo”, revela. O compositor crê que o tímido tem problemas para “romper com tudo que o faz sofrer”: “A timidez muitas vezes afasta as oportunidades. Tive que fazer um esforço enorme para acabar com isso.”

Quem acompanhou as cenas de nudez e a sensualidade da personagem Anita em A Presença de Anita não poderia imaginar que a timidez fosse uma das características da atriz Mel Lisboa. Dona de um temperamento introvertido, Mel costuma dizer que é uma “tímida extrovertida” ou que tem “uma timidez localizada”, porque, segundo ela, só em certas situações fica inibida. “Eu me retraio diante de pessoas desconhecidas. Posso até parecer extrovertida, mas, se comentam sobre mim, morro de vergonha”, confessa.

A convivência com outros artistas e famosos não a impede de “sentir um frio na barriga” quando encontra alguém que admire muito. “Fico sem graça de ir falar com a pessoa e, depois, me arrependo. Continuo assim, mesmo estando nesse meio.” Por incrível que pareça, Mel fica intimidada quando se vê diante de uma máquina fotográfica. “Foto é um ponto fraco meu”, brinca. Apesar deste temperamento, que considera “saudável”, nunca a atrapalhou em sua profissão, jamais pensou em desistir de ser atriz: “Minha timidez nunca foi grave o suficiente para ter me impedido de atuar ou ter me desestimulado no início da carreira”.

A timidez de Mel pode ser medida pela resistência em expor seu corpo. Em contraste com sua Anita, ela costuma usar roupas mais discretas e fechadas. “Acho que usar mini-saia é uma atitude muito ousada”, diz. Esse modo de se vestir pode parecer contraditório para quem ficou nua para milhões de pessoas na televisão. Para Mel, porém, ao entrar em cena, a situação é totalmente diferente. “Quando começo a gravar, a timidez não vem, porque o personagem é uma coisa e a atriz, outra. Além disso, a equipe que fazia a minissérie me ajudava muito ao deixar o ambiente mais agradável. Se fosse no teatro, talvez a situação fosse outra. No palco, as coisas são imprevisíveis”, afirma.

Mel gosta de fazer análise para discutir, entre outros assuntos, a sua timidez. “Mas nada relacionado diretamente a possíveis problemas que meu temperamento pudesse causar no trabalho”, ressalva. Em tempos em que as pessoas fazem de tudo para aparecer na mídia, ela se orgulha do seu modo de ser. “Mesmo que a gente não queira, a vida de atriz é tão exposta que é bom se preservar. Se eu forçar aparecer, posso perder o controle. É necessário o contato com a imprensa, mas não preciso ligar para dizer que meu namoro acabou”, ironiza, teorizando que o tímido já nasce com a vantagem de nunca pecar por excesso. “Em boca fechada, não entra mosquito”, conclui, rindo.

Outro artista que está entre aqueles que vão de encontro à essa época de superexposição na mídia é Rodrigo Santoro, o Diogo da novela Mulheres Apaixonadas. Um dos atores mais visados e considerado o galã do momento, Rodrigo, dentro do que sua carreira permite, não curte o modo Big Brother de ser, embora não tenha certeza se pode ser incluído na galeria dos tímidos famosos.  “Sou uma pessoa calma. Fui criado no interior, me acostumando aos poucos com o oba-oba da profissão. Nunca curti muito ficar me expondo, mas não sei se isso é o que os especialistas dizem ser tímido. Talvez eu seja uma pessoa discreta”.

 Ele justifica sua opinião dizendo que seu modo de ser nunca foi um obstáculo em sua vida e nem precisou de ajuda de algum especialista. “Tanto que virei ator”, brinca. Para Rodrigo, não há vantagem ou desvantagem em ter esse temperamento. “Cada um tem sua personalidade e toca a profissão da maneira que acha melhor.”

O psicanalista Luis Alberto Py não acredita em atores realmente tímidos. “Todo mundo se acha pelo menos um pouco tímido. A grande maioria dos artistas que dizem ser assim não sabe o que é timidez.”, diz, ressaltando que seria insuportável para este artista encarar o público: “Um tímido querer viver em cima do palco seria um contra-senso. Creio mais em uma personalidade discreta, que privilegie sua privacidade.” Py, no entanto, faz questão de separar esses artistas de compositores, como Paulinho da Viola. “Ele dá a impressão de realmente ser tímido, mas esse caso é diferente. Ele não vive no palco. Quando tem que enfrentar o público para lançar um disco, ele vai lá e pronto. Não é uma rotina.”

Para Py, timidez é um sinônimo de falta de familiaridade. “O tímido fica amedrontado, acovardado, diante de coisas que não conhece. Muitas vezes, as pessoas com uma agressividade inata maior acabam sendo tímidas, porque, como sempre olhamos os outros da maneira que nos vemos, a timidez passa a ser um modo de defesa da agressividade alheia”, explica, acrescentando que essa inibição é algo próprio de uma criança que foi educada com tudo sendo considerado perigoso. “Mas há aqueles que já nascem com isso também”, ressalva.

Tubarões a vista

Por Murillo Victorazzo (matéria publicada na ISTOÉ, maio/2003)
 
Tubarões Banhistas se refrescando em um mar calmo, com poucas ondas, numa temperatura de cerca de 30 graus. No Rio de Janeiro, nada disso seria anormal, se não fosse a aparição de um polêmico personagem: o tubarão. Desde o fim de semana passado, quatro tubarões foram vistos na costa da cidade. A população, sob orientação do Grupamento Marítimo do Corpo de Bombeiros (G-Mar), começou a evitar o banho de mar depois da arrebentação. Mas será que há motivo para tamanha preocupação?

O biólogo Ulisses Leite Gomes, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), afirma não haver razão para pânico. Segundo ele, o que aconteceu nos últimos dias é algo natural e a insegurança das pessoas se deve ao desconhecimento do assunto. “Esses tubarões vivem aqui. Este é seu habitat natural.” Ulisses conta que não é a primeira vez nem será a última que esses animais serão vistos nessas áreas. “Os pescadores de Guaratiba (zona Oeste) devem estar rindo dessa situação. Eles pescam tubarões todos os dias”.

Um tubarão de 2 metros e meio e 250 quilos encontrado na praia da Joatinga chegou a ser morto a pauladas e pontapés pelos banhistas — sem qualquer motivo, de acordo com o biólogo. “ Pelas fotos que eu vi, o animal era da espécie mangona, que se alimenta só de peixes.” Os outros tubarões, encontrados nas praias de Grumari e Guaratiba, eram da espécie anequim e também são inofensivos. A razão para estarem sendo vistos tão perto da praia é o costume de se aproximarem em busca de alimentos. “O mangona nessa época sempre migra para o norte, após sua fecundação, para soltar seus filhotes”, explica.

O fato que mais alarmou os cariocas foi a mordida sofrida por um surfista de 16 anos na praia de Copacabana. Ele levou seis pontos em dois dedos da mão direta. O biólogo Otto Bismarck, professor da Unesp, em São Vicente (SP), diz que o adolescente foi realmente alvo de um ataque de tubarão e que o animal não era anequim nem mangona. “Foi um tubarão pequeno, de cerca de 1,2 metro. Não dá pra dizer o tipo, mas não era como os outros encontrados”.

Otto, porém, afirma não haver motivo para pânico. "O que houve foi algo ocasional. O garoto estava sozinho no mar, o tubarão o viu alí e foi provar o que era. Por isso, só a mordida na mão”, diz,  acrescentando que os tubarões só atacam quando a pessoa está sozinha no mar: “Se fosse uma costa com históricos de tubarões, como Recife, deveríamos ter mais preocupação. Mas no Rio de Janeiro, até agora, não há razão para isso. Foi um fato isolado”.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Obama: o homem certo na hora e no lugar errados?

Por Murillo Victorazzo

Os meses de outubro e novembro foram bastante reveladores sobre a forma de ver o mundo da sociedade norte-americana. Tanto a derrota dos democratas nas eleições legislativas e estaduais como a repercussão do vazamento  de documentos secretos sobre a Guerra do Iraque pelo site WikiLeaks nos deixam a sensação de que o pensamento médio do Tio Sam não se modificou tão significativamente como imaginado - e desejado por muitos - após a eleição de Barack Obama, em 2008.

A vitória de um negro criado na Ásia, com ascendência muçulmana e ideias mais cosmopolitas e liberais, no sentido norte-americano do termo, parecia ser  refletir o enfraquecimento do conservadorismo, fortemente hegemônico nas últimas décadas no país. A tragédia da gestão Bush teria levado a população não só à bancarrota, mas também a um processo de realinhamento ideológico. Ao elegerem um político de roupagem e conteúdo novos, estariam dispostos a ver o mundo e a sua relação com ele de outra maneira.

Quase dois anos depois, porém, a forte oposição interna a Obama deixa à mostra o grau de otimismo inserido naquelas análises. Mais do que isto,  ao contrário do suposto, são concretos os sinais de recrudescimento da direita naquela sociedade. Certas ações do democrata, vistas até como "socialistas" pelos adeptos desta corrente, parecem ter servido, se não para expandi-la, para mobilizá-los.

Não é a derrota nas eleições de novembro em si que confirma esta ebulição. Como em qualquer outro país, foi essencialmente a debilidade da economia que derrotou Obama. Embora a crise tenha sido estourada no governo anterior, a lenta recuperação, após os bilionários aportes financeiros a empresas e bancos, indigna a população. Lá como cá, ela quer resultados rápidos. Não há espaço para culpar antecessores ou pedir paciência, na espera dos esperados efeitos das medidas implementadas.

Obama sabia que a anemia econômica do país tinha tudo para prejudicar a oxigenação pretendida na Casa Branca. Mas, para a parte do eleitorado mais liberal e centrista, sua figura renovadora estimulou esperanças desproporcionalmente maiores do que a realidade. Seus discursos, já como presidente, nos quais admitia uma situação pior do que a imaginada foram como baldes de água gelada para estes setores.

Por outro lado, os eleitores republicanos, que já não simpatizavam com Obama, não se furtaram em logo demonstrar seu regozijo com as dificuldades enfrentadas por ele. E enfureceram-se com a aprovação da reforma do sistema de saúde. Promessa de campanha e provavelmente a maior vitória do democrata nesses dois anos, a reforma foi satanizada pelos conservadores. Seria a ponta do iceberg socialista. Assim foi vista também reformas que reforçaram a regulamentação do sistema financeiro. Na cabeça deles, uma maior ação do Estado é um tiro nos ideais libertários dos Founding Fathers.

A este cenário, juntou-se as negociações para fechar o presídio de Guantánamo, a pressão para Israel congelar os assentamentos na Cisjordânia, o início de reaproximação com a Rússia e os primeiros passos para a retirada do Iraque. Se, por um lado, a guinada na política externa não foi tão aguda como esperada pelos democratas mais à esquerda (em muito devido exatamente ao complicado cenário interno), tais ações são vistas como "ameaça à segurança nacional". Ainda que o tema seja sensível a todo norte-americano, os conservadores conseguem interpretá-lo de modo ainda mais obtuso.

Antipática a Obama desde antes de sua eleição, esta parcela da sociedade norte-americana insinua dizer que, outro presidente, talvez, merecesse complacência diante da horrível conjuntura. Mas ele, o negro "muçulmano" liberal, jamais! Com este, que se diz diferente, a tolerância é zero. Não é difícil de perceber como o conservadorismo impera no imaginário médio do país, excetuando os estados da costa oeste e nordeste, como Califórnia, Nova York e Massachusets. Basta lembrar que o candidato republicano Jonh McCain, mesmo enfrentando o ônus da gestão Bush, obteve 48% dos votos populares.

Este cenário político-econômico acabou por revigorar um ultraconservadorismo que se aglutinou e ganhou espaço na mídia sob o movimento do Tea Party. Com a ex-candidata a vice-presidente Sarah Palin à frente, este grupo obscurantista, que prega até o ensino do creacionismo nas escolas e deixa perplexo até republicanos mais moderados, conseguiu eleger representantes para o Congresso. Obama, para eles, é a antítese de seus dogmas.

Outro sinal de como os Estados Unidos ainda são, em sua essência, um país voltado para dentro, pouco cosmopolita, foi a reação da imprensa ao vazamento de quase 400 mil documentos da Guerra do Iraque pelo WikiLeaks. Os papéis detalham um balanço parcial de cerca de 109 mil mortos, 66 mil dos quais civis. De 832 pessoas mortas em postos de controle dos Estado Unidos, apenas 120 eram supostos insurgentes. Vídeos e fotos de inimigos rendidos e civis indefesos executados se somam a manuais de tortura.

Um arsenal de revelações deste porte deveria levar a, no mínimo, reportagens que aprofundassem, detalhassem, o caso. Sociedade e imprensa não devem se revoltar apenas com casos de corrupção. Injustiças e mortes de civis causadas por mentiras são tão ou mais graves. No entanto, como mostra a revista Carta Capital, em matéria de Antonio Luiz Costa, os principais jornais do país preferiram dar espaço à desconstrução da personalidade do editor-chefe do site, o australiano Julian Assange.

Embora criticável, não chega a surpreender que a emissora FoxNews, caixa de ressonância das retóricas anti-Obama e pró-política externa da Era Bush, tenha dito em editorial que os funcionários do site devem ser considerados "combatentes inimigos" e submetidos a "ações não judiciais". Do mesmo modo, ela dar espaço para deputados republicanos pedirem pena de morte para um analista militar de 22 anos suspeito de participar do vazamento dos documentos.

Mas é um tanto inesperada e sintomática a postura do Washington Post, The New York Times e CNN, veículos tradicionalmente refratários aos oráculos direitistas. Ao publicarem artigos em que se coloca em dúvida a saúde mental de Assange e o acusam de violência contra mulheres, nivelaram-se às retóricas de políticos como Palin. Depois de entrarem na paronóia ufanista pós-11/9 e apoiarem a invasão ao Iraque, em 2003, tinham iniciado um processo de autocrítica, posicionando-se a favor da retirada das tropas defendida por Obama. Agora, parecem ter tido uma recaída.

O Post, diz a Carta Capital, chegou a afirmar que o WikiLeaks "não é organização noticiosa, mas empresa criminosa" e a exigir que Assange fosse preso antes de "causar mais danos à segurança nacional". Em editorial, minimizou o escândalo, afirmando que "os documentos demonstram que a verdade sobre o Iraque já havia sido contada". Para o jornal, o "enfoque" de Assange "produz pouca luz, mas causa grandes danos".  Já o Times, da cosmopolita Big Apple, num exemplo de jornalismo seletivo e enviesado, manchetou: "Detidos se deram pior nas mão de iraquianos, dizem arquivos".

Sem entrar em suposições de possíveis interesses não muito nobres, o posicionamento da mídia norte-americana nos mostra que, em momentos delicados, o vulcão conservador ufanista sempre entra em erupção naquelas terras.  Por mais progressista que alguns setores possam querer parecer, acabam por defender táticas maquiavélicas em nome de um nacionalismo raso.

É em meio a uma sociedade com este DNA que surge um político como Obama. Sua ascensão é um fato histórico repleto de paradoxos. Chegou à Casa Branca sob duas guerras polêmicas e a diminuição do prestígio e do poder relativo perante o mundo. Foi, porém, a maior crise econômica desde a Depressão de 1930, mais do que qualquer outra razão, que o levou a vitória. Sem ela, sua eleição seria impensável. A maioria da sociedade não se permitiria arriscar tanto votando em uma personalidade com ethos tão diferente de si própria em um cenário de relativa calmaria.

Esta mesma crise, que exige tempo e capital político que poderiam ser gastos em inflexões maiores, volta-se agora contra ele, enfraquecendo-lhe e dando maioria aos republicanos na Câmara dos Representantes. Sua vitória, em 2008, que poderia refletir mudanças de paradigmas no norte-americano médio, com a centro-esquerda ganhando espaço, parece ter catalisado efeito inverso.

O novo tabuleiro, certamente, o fará negociar mais com a oposição, obrigando-o a abandonar qualquer projeto de cunho mais reformista, tanto internamente como em sua política externa. Arriscar-se-ia a se dissociar ainda mais do pensamento médio de seus compatriotas, diminuindo ainda mais as chances de obter um segundo mandato, em 2012.

Sem querer santificá-lo ou eximi-lo de eventuais erros ou contradições no exercício do cargo, é inegável que Obama tem todas as credenciais para revigorar a Casa Branca. Algumas de suas decisões corroboram a afirmação. Elas, porém, não foram reconhecidas por boa parte da população, o que deixa no ar a sensação de que ele é o homem certo na hora errada. E, talvez, até no lugar (país) errado.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O presente dos desastres

Por Janio de Freitas (Folha de S. Paulo, 16/11/2010)

O Governo Lula é uma sucessão de fatos inesperados, mas dois deles têm a dimensão extraordinária das mágicas do acaso. É à inversão imprevista de duas derrotas brutais, com tudo para arrasarem sua imagem e o governo, que Lula vai se despedindo da Presidência com o registro de êxitos sem precedente entre seus antecessores todos. E mesmo como um caso especial no mundo.

O mensalão foi um canhonaço que destroçou muito mais do que a aparelhagem executiva da Presidência e, com ela, o braço de operações montado sobre a leviandade da direção petista. O mensalão pôs em ruína, também, toda estratégia e o plano de configuração do poder que deveria executá-la.

Nesse poder, o papel de regente do Executivo dividiu-se, quase definidamente por setores, entre José Dirceu, Antonio Palocci e Henrique Meirelles. Mas o maestro político era José Dirceu, só ele. Ao Lula que então se viu coube reter-se no seu já comprovado talento: mobilizar parcelas sucessivas da opinião pública, o jogo de cena, as viagens e a presença em eventos que ocupassem o tempo presidencial.

Era um Lula distante da ação política e do trânsito de políticos, comum para presidentes. Com muitas evidências de insegurança e de alheamento às coisas de governo, incapaz de enfrentar uma entrevista coletiva e mesmo algo menor que não estivesse arranjado.

A saída de José Dirceu de suas funções no plano e no Gabinete Civil era tão impensável, antes de forçada pelo mensalão, que não houve ideia alguma para preencher o vácuo no seu aspecto essencial, que era a ação política do governo.

Aumentados os seus temores de que novos tropeços, mesmo que menores, atingissem sua continuidade como presidente, restou a Lula improvisar ele próprio o comando e a execução das ações políticas do governo.

Tateante, cedendo muito mais do que o necessário, fazendo dívidas precipitadas sem escolher os políticos credores, Lula perdeu muito, mas com o tempo ganhou tarimba e segurança, suficientes para o necessário sem brilho. Até que sobreveio a segunda explosão, onde menos seria esperável.

O escândalo de Antonio Palocci não desarmou Lula apenas na vigilância de uma política econômica conservadora com temperos neoliberais. Essa função fizera de Palocci uma espécie de guarda-costas de Lula em setores real ou potencialmente hostis e ameaçadores, como o financeiro, o dos meios de comunicação, o do empresariado influente e, não menos, o do sistema internacional de defesa do conservadorismo.

Guido Mantega não caiu do céu. Veio das profundezas ferventes onde foi posto pela corrente Palocci, desde antes da formação inicial do governo; e, depois, pelas mal contidas restrições ao conservadorismo econômico do governo.

Mas, quando um caseiro desacreditou dos ares beatíficos de Palocci, Guido Mantega, ministro do Planejamento, foi visto como o único a estar informado dos aspectos todos da economia, para cobrir o vácuo ainda que só pelo tempo para a solução definitiva.

De lá para cá, Lula fez uma dívida enorme com Mantega. A retomada do crescimento e seus múltiplos efeitos de força política e eleitoral devem-se à persistência de Mantega na ideia, que o alijara, de buscar a conciliação de crescimento e inflação baixa. A tranquilidade e a boa dose de otimismo que se instalaram no Brasil, e contribuíram muito para o processo sucessório sem turbulências, são frutos dessa bem sucedida conciliação não conservadora.

Em outro plano, com o crescimento sem inflação, Lula se viu projetado, da simpatia folclórica dedicada pelo Ocidente ao metalúrgico-presidente, à possibilidade de uma admiração e, depois, de uma influência internacional que soube cultivar muito bem.

O mensalão e a queda perturbadora de José Dirceu levaram Lula ao comando político que lhe deu uma liderança sem precedente. O escândalo e queda ameaçadora de Antonio Palocci resultaram para Lula em uma presença internacional sem nem sequer algo próximo em outros presidentes brasileiros.

sábado, 13 de novembro de 2010

A noiva socialista e o noivo mineiro

Por Murillo Victorazzo

Em sua edição especial sobre a eleição de Dilma Rousseff, a revista Carta Capital traz uma entrevista com o governador reeleito de Pernambuco, Eduardo Campos, que nos indica um cenário para 2014 com boas chances de se realizar. Campos deixa clara suas boas relações com o ex-governador mineiro Aécio Neves e não se furtar de criticar a ala paulista do PSDB. Presidente do PSB, parece sugerir que passa por Aécio a estratégia do partido para 2014.

"Muitas vezes, São Paulo exporta diferenças que não são a realidade política nacional", afirma o governador ao ser perguntado sobre se haveria afinidades com os tucanos não paulistas. Mais do que uma constatação que nos remete às afirmações de políticos e cientistas políticos de que a luta PT x PSDB seria menos por grandes diferenças ideológicas do que por uma rivalidade paulista vendida para o país, a frase é uma sutil defesa da liderança de Aécio dentro no PSDB.

Quanto mais Aécio se cacifar no PSDB, mais poder de barganha o PSB terá no governo Dilma. Afinal, com seis governadores, a sigla continuará a ser, agora ainda mais, um aliado necessário e desejado pelo PT. Caso Aécio venha a ser indicado como candidato a presidente pelo PSDB nas próximas eleições, não será surpresa se os socialistas romperem com Dilma ao final do governo para se coligarem com os tucanos.

A vice-presidência em uma chapa com o PSDB cairia bem para Campos ou Ciro Gomes - outro político do partido que não nega a afinidade com Aécio. Ainda mais se levarmos em conta que os dois socialistas são do Nordeste, uma região problemática para os tucanos. Governando Perambuco, Ceará, Paraíba e Piauí, o PSB seria a noiva perfeita para eles.

Ao dizer que "o PSB tem as portas abertas para pessoas como Aécio",  Campos levanta outra hipótese, essa menos provável: o ex-governador de Minas deixaria o ninho tucano para se juntar- por mais ideologicamente estranho que possa parecer  - às hostes socialistas. A saída do mineiro do PSDB foi bancada pela Carta Capital em matéria de capa refutada veementemente por ele. A revista, porém, dizia que Aécio pretendia formar um novo partido.

A tese da candidatura própria já foi levantada no PSB este ano por Ciro e causou desgaste entre integrantes da legenda e o PT. Com o reforço muscular ganho em votos pelo partido nestas eleições e com tal carta na manga, seria inevitável o fim do casamento entre petistas e socialistas. Uma união que percorreu todas as eleições presidenciais de 1989 para cá, exceto o primeiro turno de 2002. Naquele ano, os socialistas lançaram Anthony Garotinho e apoiaram Lula apenas no segundo turno.

É um tanto precipitado prever cenários para daqui a quatro anos. De todo modo, nesses próximos quatro anos, casamentos políticos estarão à prova. E parecem claros quais serão alguns dos noivos e noivas protagonistas. Neste triângulo "amoroso", é certo que um deles vem de Minas, e uma delas tem grinalda vermelha e amarela.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Dois pesos e duas medidas?

Por Murillo Victorazzo

Chama a atenção como a edição impressa de O Globo desta quarta-feira, 10/11, ignorou completamente o discurso do chanceler britânico, Wlliam Hague, na Canning House, em Londres. Segundo informou o site da BBC Brasil na véspera, Hague afirmou que "continuará a pedir por uma reforma na ONU, incluindo a expansão do Conselho de Segurança com o Brasil como membro permanente".

A notícia foi reproduzida no Globo Online, mas, pela lógica jornalística, deveria ganhar espaço na versão impressa do jornal, principalmente por ter sido um dia após o presidente norte-americano, Barack Obama, em discurso na Índia, defender a inclusão daquele país no Conselho. A nova postura dos Estados Unidos, essa sim, mereceu amplo destaque, até com chamada de capa.

Ainda que conheçamos a diferença de peso político-econômico entre os dois países anglo-saxões e os interesses comerciais em jogo, os britânicos também têm poder de veto. E parecem, agora, dispostos a se juntar à França na defesa da candidatura brasileira. Expõr a visão do novo governo do Reino Unido seria uma ótima oportunidade para ressaltar contrapontos em uma questão tão complexa e importante para as relações internacionais atuais.

A fala de Obama foi logo interpretada pelo Globo, em editorial e na coluna de Merval Pereira, como grande revés para o Brasil, sinal do "fracasso" da "diplomacia companheira". Seria justo e esclarecedor, para o bem de suas qualidade, credibilidade e isenção, que o Globo também informasse e comentasse o discurso do chanceler britânico. Segundo Hague, a presença do Brasil como membro permanente do Conselho seria uma questão de "legitimidade e equilíbrio" mundial de poder.

Se a posição de Obama foi rotulada como sinal de fracasso da política externa do governo Lula, a afirmação de Hague, por este raciocínio prosaico, não deveria ser interpretada como o outro lado da moeda: o de uma "vitória" do Itamaraty? Ou o jornal estaria usando dois pesos e duas medidas? É uma pena que as análises internacionais de boa parte dos jornais brasileiros estejam impregnadas pelas disputas políticas internas...

ATUALIZAÇÃO: O jornal, enfim, em sua edição impressa de quinta-feira, 11/11, publicou uma matéria de pé de página sobre o discurso do chanceler britânico. Tomara que o atraso de 48 horas tenha sido por problemas técnicos...Aguarda-se os comentários...

sábado, 6 de novembro de 2010

O Mundo Segundo Dilma

Por Maurício Santoro (http://todososfogos.blogspot.com/2010/11/o-mundo-segundo-dilma.html )

A política externa não foi um tema de discussão relevante na eleição presidencial brasileira, mas será importante para o governo Dilma. A economia internacional é cada vez mais relevante para o Brasil, pelo peso crescente do comércio exterior no PIB, pelas discussões sobre a guerra cambial e a reorganização do sistema financeiro internacional (G-20, Basiléia 3 etc). Além disso, o país articula iniciativas com as outras potências emergentes e precisa permanecer atento para as crises e conflitos na América do Sul, algumas das quais envolvem nações das quais depende sua segurança energética (Bolívia e Paraguai). O que se pode esperar da diplomacia brasileira sob Dilma?

Durante a campanha, a revista “Política Externa” enviou aos principais candidatos perguntas sobre sua plataforma diplomática. José Serra não respondeu – omissão curiosa, pois é uma publicação com muitos intelectuais do PSDB entre seus principais colaboradores. Marina Silva destacou pontos ligados a Meio Ambiente e Direitos Humanos. E Dilma apresentou opiniões que basicamente mantêm as diretrizes atuais. Perfis da presidente eleita com freqüência destacam sua pouca experiência internacional e concluem que dará menos ênfase à diplomacia presidencial e se afastará de negociações controversas, como os esforços de mediação da crise iraniana.

Contudo, as próprias transformações do Brasil apontam para mudanças. As indicações são de uma política externa mais complexa, menos centrada na Presidência e no Itamaraty e mais ramificada por outros órgãos do governo: ministérios econômicos, Defesa, área social, BNDES, empresas controladas pelo Estado, como a Petrobras, ou aquelas nas quais ele possui golden share, como Vale e Embraer. É a conseqüência inevitável da combinação de crescimento econômico, estabilidade política e maior engajamento nas redes globais de comércio e investimento.

Quem melhor capturou este novo quadro foi o jornalista David Rothkopft, da revista Foreign Policy. Em ótimo texto, ele chama a atenção para a necessidade dos Estados Unidos pararem de tratar o Brasil dentro do contexto de uma política geral para a América Latina, e abordarem o país numa esfera mais ampla, como um interlocutor para os principais temas internacionais, sobretudo em assuntos ligados à economia. Dito de outro modo: política externa é cada vez mais relevante para o Brasil, independentemente do interesse pessoal mais ou menos intenso do chefe de Estado.

Além disso, há outro ponto que tem sido deixado de lado pela maioria das análises: o modo como a diplomacia de perfil globalista de Lula reforçou a identidade de esquerda do governo, por sua ênfase em cooperação sul-sul e parcerias com potências emergentes. Haverá expectativas e cobranças do PT e de outros partidos progressistas da coligação para que essa linha diplomática continue ou se aprofunde, sobretudo diante dos impasses da liderança dos EUA e da União Européia, devido às suas crises atuais.

Também estou curioso para ver como duas mulheres e presidentes latino-americanas enfrentarão um desafio parecido: provar que têm capacidade de liderança própria. A relação Argentina-Brasil sob Cristina-Dilma promete, inclusive pela força da história de vida da mandatária brasileira para o vizinho que tanto sofreu com ditaduras militares.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

2014 é logo ali

Por Murillo Victorazzo
Há uma máxima entre políticos e especialistas da área de que uma eleição começa quando a anterior termina. Descontados os exageros, a frase guarda uma boa dose de verdade. A presidente eleita Dilma Roussef nem diplomada pelo TSE foi e os partidos da base iniciaram as cotoveladas para definirem seus espaços no novo ministério. Do mesmo modo, na oposição, 48 horas depois da derrota, foi dada a largada para a lavagem de roupa suja em público. O motivo é um só: o realinhamento do mapa político-eleitoral do país visando 2014.
Quatro anos é, em tese, muito tempo. E a história mostra como o quadro imaginado não se confirma. Mas a próxima eleição presidencial, ao contrário das anteriores, quando havia antecipadamente um candidato natural (o presidente em busca de reeleição, no mínimo), é uma incógnita ainda maior. A falta de estatura política da presidente eleita Dilma Roussef e a sombra do presidente Lula potencializam as dúvidas não só sobre o novo governo como se ela disputará mais um mandato.
Além do imponderável que, às vezes, transforma o processo eleitoral insperadamente, várias incertezas explicam o mistério. Lula, de fato, desejará voltar ao governo daqui a quatro anos? Caso Dilma tenha se saído bem avaliada, poderá ela, dona da caneta, bater de frente com ele para ser a candidata do PT? Ou, o contrário: será que ele não irá preferir manter a imagem de quase um mito, deixando como sua marca na história estes oito anos dos quais saiu com 80% de aprovação? Para que, afinal, correr o risco de ver esse capital político gigantesco se diluir em um outro mandato?
Por outro lado, na hipótese de o governo Dilma fracassar retumbantemente, terá Lula disposição para passar toda a campanha eleitoral com o ônus de ter que assumir a responsabilidade da escolha feita em 2010? Sem dúvida, neste cenário, a possibilidade de derrota aumentaria muito, já que os eleitores poderiam culpá-lo pelo eventual desastre. O discurso da volta para consertar um erro não é de fácil assimilação.
Além destas incertezas, há outras dentro da própria base governista. Pela primeira vez como sócio e não apenas como aliado, o PMDB do vice-presidente eleito, Michel Temer, fincará o pé em busca de mais espaço no próximo governo. A ciumeira já começou. O partido fez questão de deixar claro o incômodo por não ter visto um nome seu na equipe de transição, o que levou a presidente eleita emitir nota incluindo Michel Temer no grupo que já contava com os petistas Antonio Palocci, José Eduardo Dutra e José Eduardo Cardoso.
O casamento PT x PMDB será, durante o novo mandato, uma constante relação de amor e ódio. Será que a animosidade não prevalecerá e, com mais poder acumulado, os peemedebistas, enfim, tomarão coragem de lançar candidato próprio? Alguns nomes do partido saíram especialmente mais fortes destas eleições. O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, é um deles.
Além de reeleito no primeiro turno com 66% dos votos, Cabral se jogou de cabeça na campanha da petista. O discurso de parceria foi fundamental para a ampla vitória dos dois no estado. Tem agora cacife para exigir mais recursos e espaço. Além disso, não nos esqueçamos que a capital fluminense terá que ganhar atenção especial por ser palco das Olimpíadas de 2016 e da abertura da Copa de 2014.
Outro partido aliado que saiu mais forte foi o PSB. Com seis governadores eleitos, os socialistas deverão também lutar por mais espaço. Se, este ano, já houve alas da sigla que tentaram lançar Ciro Gomes candidato a presidente, pode-se imaginar que a ideia da candidatura própria ganhará mais força a partir de agora. No mínimo, para barganhar a vice-presidência em 2014.
O governador reeleito de Pernambuco, Eduardo Campos, campeão de voto no país (obteve 82% dos votos), surge como a principal carta do partido para as negociações que virão. Seu nome tem simbolicamente o peso de ser do Nordeste, região que se tornou uma fortaleza para o lulismo, embora, pardoxalmente, isto possa lhe enfraquecer. O costume é compor chapa com políticos de regiões onde são mais fracos eleitoralmente.
Do outro lado do tabuleiro, mal as urnas foram fechadas, o PSDB externou seus dilemas existenciais e suas divisões internas que perduram há anos. Aquele partido fundado há 22 anos como a esquerda do PMDB, uma sigla social democrata, com valores liberais - no sentido moral da palavra e não econômico - não existe mais. Se há uma certeza que surge deste pleito é a de que os tucanos ganharam uma feição mais forte de partido conservador. Discursos e temas levantados pelo candidato José Serra e seu círculo embasam a afirmação.
Se, por um lado, não se pode dizer que tenham se tornado uma sigla essencialmente de direita, por outro, é fato que se tornou o preferido deste espectro da sociedade. Ocupou o espaço deixado pela falta de um partido forte confessamente de direita. O DEM, que seria o representante natural e legítimo destes setores, por sua debilidade eleitoral, preferiu manter-se como satélite tucano. Alguns líderes do partido ameaçam partir para voo solo, mas a falta de nome é mais um empecilho para concretizar a separação.
Mesmo em relação aos feitos quando governo, o PSDB parece ter dificuldade em superar a sua esquizofrenia. Não por acaso o ex-presidente Fernando Henrique já veio a público dizer que não irá mais endossar "um PSDB que não defende sua história". Também lá de São Paulo, outro disparo foi feito, desta vez acirrando as divergências internas. O coordenador do programa de governo de Serra, Francisco Graziano, em seu twitter, ironizou a derrota de seu candidato em Minas Gerais, responsabilizando, indiretamente, seu colega de partido Aécio Neves.
Muitos garantiam que esta seria a última tentativa de Serra para chegar ao Planalto. O político que garante ter se preparado a vida inteira para se tornar presidente, porém, ao reconhecer a sua segunda derrota em nível nacional, não pareceu ter jogado a toalha. E mais: acenou para uma oposição mais belicosa da que fez até então. Ainda que tenha anunciado não pretender a presidência do PSDB, Serra, a priori, não pode ser uma página virada, embora a tendência seja que Aécio torne-se o líder da oposição.
O ex-governador mineiro terá a visibilidade que um mandato de senador - e não um senador qualquer - lhe garante e pode ser o sangue novo necessário para despertar novas ideias e paixões. O terreno, de todo modo, é fértil para a colheita de fortes embates neste ninho, especialmente se indagarmos o que o paulista Geraldo Alckimim, como governador do estado mais rico e populoso da federação, pensa a respeito de seu futuro político.
No entanto, mais do que nomes, o PSDB precisa urgentemente criar novas bandeiras e decidir o que quer ser: uma UDN com modelito século XXI ou um partido realmente social democrata. Não é uma escolha fácil. Ao caminhar para a centro-esquerda, abandonando a esquerda socialista, o PT, com Lula e agora Dilma, parece ter se legitimado como o representante da social democracia. E com uma vantagem que os tucanos não tem: bases sociais mobilizadas. As posturas erráticas dos tucanos facilitaram este processo. Ao contrário do som, o poder se propaga no vácuo - deixado pelo adversário.
Há tempos muitos dizem que tucanos e petista estariam fadados a serem aliados. O realinhamento petista poderia ter facilitado esse movimento esperado, se os dois partidos não tivessem se tornado os dois únicos pólos de poder no país, com o PSDB dando um passo para a centro-direita. Hoje, nem os mais otimistas acreditam na aproximação.
Até por questão de sobrevivência, na expectativa de voltar ao poder central, os tucanos terão que fazer uma oposição mais intensa para se diferenciarem. Como os pilares das política econômica são consenso entre os dois lados, o mais provável é que eles acabem cada vez mais parecidos com o DEM, incorporando os setores (e valores) mais conservadores.
Aprovar ou não esta contínua guinada é decisão do eleitor. Mas é impositivo que, para dar certo, ela seja nítida, programática e sem idas e vindas. Como se vê, este balaio de variáveis, seja nos governistas como na oposição, explica por que apenas 48 horas separaram a eleição de Dilma do pleito de 2014...