quinta-feira, 26 de abril de 2018

O desembargador explicitamente militante

Por Murillo Victorazzo

Nesses dias em que são aventadas todos os tipos de relações entre juízes (de todas as instâncias) e grupos políticos, algumas bem esdrúxulas, incoerentes ou sem base factual, um exemplo se destaca por ser de transparência estarrecedora, sem risco de ser leviano.

Segundo a "Folha de SP" de anteontem, ao dar seu voto vencido no julgamento do ex-governador mineiro Eduardo Azeredo (PSDB), o desembargador do TJ-MG Eduardo Machado chamou o réu de "nosso governador", um "homem de bem" que "devemos preservar a qualquer custo"; alguém que não deve ser jogado "nessa lama hoje nós temos aqui de que todo político não presta".

Machado afirmou não acreditar que Azeredo estivesse envolvido no caso, pois “o que ele precisava ele tinha: votos.” "Foi um plano mirabolante para elegê-lo e conseguir uma vaga de secretário. Se teve participação, foi de omissão. De confiar em quem não podia confiar", garantiu, não sem antes lamentar: "Estamos sepultando o pouco do que ainda nos resta do conceito e reserva dos políticos mineiros. Por dever de ofício, participo de um velório, mas não carrego o caixão."

Ex-advogado, o desembargador foi alçado ao TJ em 2009, na gestão do também tucano Aécio Neves. Dos seis selecionados em uma primeira lista elaborada pela OAB, foi o menos votado, revelou o jornal. Sem um pingo de constrangimento, ainda apontou o dedo para os demais togados ao afirmar que "muitos ali" teriam votado no tucano. E daí?

Palavras, em tom e conteúdo, esperadas de ardorosos militantes partidários em conversas de botequim, redes sociais e comícios. Não em plenário de tribunal. Juiz não acusa nem defende; julga sob critérios técnicos, ainda que com eventual viés político. Elementar. Nem Tóffoli, sobre petistas, ou Gilmar Mendes, para emedebistas e tucanos, chegariam a tanto. Pior, nada acontecerá com ele. É de cair o c... da bunda.

sábado, 21 de abril de 2018

Júlio César e Flamengo: um eterno caso de amor correspondido

Por Murillo Victorazzo

Um time insosso, que acumula fracassos e frustrações há mais de um ano - a mais recente na última quarta-feira, leva mais de 50 mil pessoas ao Maracanã em um jogo contra o medíocre América-MG. Por quê?

Simples: a Nação Rubro-Negra ama quem a ama, quem a respeita e principalmente quem sabe ou soube traduzir essas palavras principalmente em campo - nos bons e maus momentos - mas fora também: o cara largou a mulher em Lisboa pra jogar contra Boa Vista em Bacaxá, num Carioquinha, só para encerrar a carreira no seu time de coração!

Pouco importa o que ele fez com a camisa do Brasil - ele poderia ter tido culpa nos sete gols da Alemanha. Nada importa o que torcedores dos outros times pensam dele. Pouco importa seus títulos europeu e mundial pela Inter de Milão em 2010, quando foi eleito o melhor goleiro do mundo, ainda que dê orgulho uma "cria da Gávea" lá fazer sucesso. Importa é sua história no clube de maior torcida do país mais vitorioso do mundo no futebol e sua relação de apaixonada reverência recíproca com ela.

O choro do sempre discreto Juan pela despedida de seu amigo desde as categorias de base resume tudo. É muito flamenguismo raiz, legítimo, sincero, numa cena só. Valeu, Julio César!!!! Valeu muito!

O general ideologizado que reclama de ideologia

Por Murillo Victorazzo

O gosto por usar redes sociais já se tornou marca do comandante do Exército, general Villas Bôas. Recentemente causou apreensão com seus comentários sobre impunidade somente às vésperas do julgamento do habeas corpus de Lula no STF. O silêncio imperou quando outros escaparam da Justiça.

Agora, Villas Bôas resolveu criticar a suposta "ideologização dos problemas nacionais", como transcrito pelo excelente escritor Laurentino Gomes em seu twitter. O que afinal o general quis dizer com tal frase? 

Não só se pode como se deve criticar visões ideológicas extremadas, que beiram dogmas, sobre determinados assuntos, à esquerda e à direita. Sim, muitos resvalam neste erro, que simplifica o que é complexo. Mas certamente não foi este o sentido da declaração.

Para alguns setores da direita, algo ideologizado é sinônimo de “esquerdismo.” No mau sentido. É uma maneira subliminar de afirmar que sua visão de mundo é a racional, a pragmática, logo isenta e certa. Todo o resto seriam pontos fora da curva da lógica; devaneios, paixões, de fanáticos, utópicos ou de quem deseja destruir a “ordem”e a “família”. Desonestidade intelectual em forma de falácia

General, há muitos ideologizados ao seu redor. Quem, por exemplo, afirma que 1964 foi uma “revolução” e não golpe de estado, a partir da qual se instalou não uma ditadura mas um “regime militar” em que se combateu apenas “terroristas marxistas”, ou vê os governos petistas como comunistas, está radicalmente ideologizado (para não dizer adestrado).

País nenhum do mundo pensa sem debate de IDEIAS, por pior que elas sejam. É bem diferente de lamentar polarizações reducionistas e sem bases conceituais corretas. É antes de tudo questão de semântica.

terça-feira, 17 de abril de 2018

Rebelo: o triste fim de (mais) um ex-comunista

Por Murillo Victorazzo

Quadro histórico do PCdoB e ministro de várias pastas nos governos do PT, Aldo Rebelo se transferira para o PSB em setembro passado. Lá pouco tempo ficou, dizendo “não se sentir confortável” com a presença de Joaquim Barbosa, possível candidato à Presidência pela sigla.

Quem já leu entrevistas de Barbosa ou se recorda de suas posições em votações no STF e CNJ sabe que o ex-presidente da Corte pode ter vários defeitos, mas de direita não é - exceto, claro, para petistas, para os quais aquele que ousa ir contra Lula é “fascista” ou “conservador”. Condenar o “guerreiro do povo brasileiro”José Dirceu e outros será sempre imperdoável.

Barbosa, por exemplo, já se mostrou contra o Estado mínimo ultraliberal, simpático a ações afirmativas e ideias progressistas de costumes e declarou-se eleitor de Lula e contra o impeachment de Dilma. Até por isto, grupos de bolsonaretes e assemelhados o têm chamado de “cavalo de Troia”: sua atuação no mensalão teria sido disfarce de um “socialista” para penetrar nas hostes da direita.

Rebelo preferiu ser pré-candidato ao Planalto pelo Solidariedade (SD) e ser companheiro de Paulinho da Força (à dir.) e Wladimir Costa (à esq.), o bizarro deputado da tatuagem de Temer, ambos com ficha corrida condenável e entusiastas da deposição de Dilma. Triste fim de (mais) um ex-comunista.

sábado, 14 de abril de 2018

Temer na Cúpula Das Américas: previsível e hipócrita

Por Murillo Victorazzo

A declaração do presidente Michel Temer sobre os ataques militares de EUA, Reino Unido e França contra a Síria, na Cúpula das Américas, no Peru, resumiu-se à defesa de princípios tradicionais do Itamaraty, como respeito aos tratados internacionais (condenou o uso de armas químicas - embora sem acusar diretamente o ditador sírio Bashar Al-Assad), defesa da solução pacífica dos conflitos e a proibição do uso não pacífico da energia nuclear no Brasil, estes dois últimos escritos inclusive na Constituição de 1988.

Deixou, porém, de lado outro traço histórico da Casa de Rio Branco, a valorização do multilateralismo: não disse nem que sim nem que não acerca da legalidade de um ataque sem a aprovação do Conselho de Segurança da ONU, e antes mesmo da conclusão oficial de inspetores sobre os ataques químicos.

Compreensível. Diante da débil conjuntura do país e da fragilidade de imagem de seu governo interna e externamente, o muro é o melhor lugar. Nada mais protocolar. O esquisito, tamanho surrealismo cínico, foi sua eloquência ao afirmar que “não se pode tolerar a corrupção” porque ela “corrói a sociedade”.

quarta-feira, 11 de abril de 2018

Rocha e MBL, tudo a ver

Por Murillo Victorazzo

Capa da revista "Época" desta semana, o evangélico Flávio Rocha, dono da Riachuelo e presidenciável dos sonhos do barulhentos jovens conservadores do Movimento Brasil Livre (MBL), pode esmiuçar um pouco sua visão de mundo. Em transcrição de conversa com o ateu Roberto Justus, por exemplo, ficamos sabendo que, para ele, a África é pobre e palco de tantos dramas humanitários “porque eles rezam para os Deuses errados”.

Quando instado a comentar sobre segurança pública, afirmou que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), sancionado na década de 90 pelo então presidente Collor, é herança da “Era PT”, e foi além: o caos da segurança publica no Rio de Janeiro, assegura, se deve a anos de “governos de esquerda”.

Ok, Brizola e os Garotinhos (sem falar os oito meses de Benedita) podem ser vistos à esquerda, mas o “temerista” Moreira Franco, ainda na década de 80, foi quem prometeu acabar com a violência em seis meses e saiu pela porta dos fundos do Palácio Guanabara. O tucano Marcelo Alencar teve o general Nilton Cerqueira, figura controversa por seu papel na ditadura militar, na Secretaria de Segurança Pública durante boa parte do seu governo. Criticas da “esquerda” por sua politica de “gratificação faroeste” não faltaram. 

Mais recentemente, desde 2006, o estado é governado pelo PMDB. Se a memória já lhe fala, não custa recordar:  delegado da PF, José Mariano Beltrame foi o homem forte da área à frente até recentemente. E também de parte da esquerda, digamos a mais "radical", foi de onde saíram os principais petardos contra sua joia da Coroa, as UPPs. Ah, Cabral e Pezão, esses dois tremendos "comunas"...

Não se trata de defender A ou B. Esses trechos da matéria servem apenas para mostrar como a direita conservadora recém-saída do casulo graças às redes sociais e lambanças petistas, é radicalizada, ignorante e reducionista - adjetivos quase sinônimos.

Não por acaso, Rocha acha Rodrigo Constantino “genial”.  E, claro, repete “fake news” de corrente de whatsapp para atacar parlamentar petista - modus operandi do seu fã clube, que surgiu como movimento contra a corrupção, mas se calou com os escândalos da turma hoje no Planalto, e difundiu leviandades contra a vereadora carioca Marielle Santos, executada a tiros há 12 dias.