sexta-feira, 21 de abril de 2017

Como lidar com regime mais perigoso do mundo

The Economist* (21/04/2017)

A Coreia do Norte pode ser tão confusa como alarmante. É uma monarquia hereditária marxista. Tem o líder mais jovem do mundo e também o mais antigo. O tirano reinante, Kim Jong-Un, está em seus 30 anos; e seu avô, Kim Il Sung, é o "Presidente eterno", apesar de ter morrido em 1994. Para comemorar o aniversário do vovô Kim em 15 de abril, seu neto ordenou que aviões sobrevoassem escrevendo no céu sua idade: 105.

Também ordenou um desfile gigantesco, com soldados e mísseis em caminhões. Um coro masculino cantava "A paz é garantida por nossos braços", mesmo que o regime ameace fazer chover a destruição de seus inimigos e está a prestes a construir um míssil projetado para atingir o território norte-americano.

Lidar com o Deus-Rei Júnior belicoso será uma das tarefas mais difíceis de Donald Trump. Também será o primeiro grande teste de como ele lida com as relações em transformação com a China, potência que desafia crescentemente a Pax Americana na Ásia.

 Não há boas opções, mas chegar ao menos-mal exigirá a compreensão tanto do regime e como do quebra-cabeça geopolítico asiático no qual ele se encaixa. Também exigirá paciência. Sinistramente, Trump diz que ele tem pouco quando se trata de Coreia do Norte, e seu vice-presidente, Mike Pence, afirma que "todas as opções" estão sobre a mesa.

Querer fazer algo rapidamente é emocionalmente apelativo.  A Coreia do Norte é uma ditadura vil, ensanguentada, onde qualquer indício de deslealdade é punível com "Gulag" ou a morte. Kim prende filhos presos por crimes de pensamento dos seus pais e mandou matar seus próprios familiares mortos por capricho. A perspectiva desste homem ameaçando Los Angeles é angustiante.

 Ainda na Coreia do Norte, um ataque preventivo seria imprudente. Seus dispositivos nucleares estão escondidos, possivelmente em profundos subsolos. Seus mísseis são dispersos em lançadores móveis. Tóquio é só atravessar o mar do Japão. Seul, a capital da pacífica e capitalista Coreia do Sul está a  apenas algumas milhas da fronteira. A artilharia e mísseis convencionais poderiam devastá-la, em um conflito que pode rapidamente transformar-se nuclear e matar milhões de pessoas.

Trump não vai querer começar uma guerra. Suas ações militares na Síria e Afeganistão sugerem que ele é mais cauteloso do que faz soar. Mas mesmo a apenas impressão de que ele pode atacar primeiro é perigoso. Se Kim acreditar que um ataque americano é iminente, pode lançar seu próprio ataque nuclear preventivo, com consequências desastrosas. Trump deveria, portanto, esfriar sua retórica imediatamente.

Afora suas excentricidades, Kim comporta-se racionalmente. Assistiu Muammar Kadaffi,  na Líbia, desistir de seu programa nuclear em troca de melhores relações com o Ocidente — e acabar morto. Ele vê seu arsenal nuclear como garantia de que seu regime - e ele- irão sobreviver (embora seja suicida para ele usá-lo).

Trump pouco pode fazer para mudá-lo de ideia. As sanções econômicas que prejudicam o povo norte-coreano não vão tirar o apetite do ditador. Cyber-ataques, que podem explicar o fracasso de alguns recentes lançamentos de mísseis, podem retardar mas não impedi-lo. Apenas com a ajuda da China a  América pode resolver o enigma coreano.

A China está em vantagem sobre Kim. É responsável por 85% do comércio exterior da Coreia do Norte e poderia interromper seu suprimento de petróleo. Mas seus interesses não são os mesmos da América. A Coreia do Norte é seu aliado. Os líderes chineses não gostam do regime de Kim, mas não desejam vê-lo entrar em colapso, muito menos a unificação, no estilo alemão, com o Sul democrático. Seria, para o pavor chinês, a perda de uma valiosa reserva. Há 28.500 soldados americanos estacionados no sul; a China não os quer em sua fronteira.

Para conter a Coreia do Norte - e para conduzir uma política externa bem sucedida mais amplamente - Trump tem que aprender a falar com a China. Seu instinto é fazer negócios. Na semana passada, twittou que dissera a Xi Jinping, o presidente chinesa, que "um acordo de comércio com os EUA seria "muito melhor para eles caso resolvem o problema da Coreia do Norte!" Mais tarde, explicou que sua decisão de não acusar a China de manipuladora de moeda, como tinha ameaçado, era um quid pro quo para China ajudar na crise com Coreia do Norte. Abandonar a ameaça sobre a moeda foi a política certa, mas a abordagem diplomática transacional de Trump é a errada.

A China adoraria esculpir o mundo bilateralmente em esferas de influência, com as grandes potências dominando suas regiões e troca de favores em outro lugar. A América tem sido a guardiã de algo diferente: uma ordem baseada em regras que se aplicam a todos países, grande ou pequeno, e que sustentou a relativa paz e o crescimento notável do mundo desde 1945. Trump aparentar desprezar esta ordem global baseada em regras é preocupante.

O mundo será um lugar mais perigoso se a América começar a deixar a China quebrar regras (por exemplo, no mar da China Meridional) em troca de ajuda na resolução de qualquer questão que passe a ser notícia.  Para a América, a melhor resposta à ascensão da China seria reforçar a ordem baseada em regras e convidá-la a participar mais ativamente. Infelizmente, é improvável que Trump faça isso.

Assim, a esperança é que ele ou seus diplomatas convençam os chineses que é de seu próprio interesse para travar a Coreia do Norte. E a maneira de fazer isso é falar especificamente sobre a Coreia do Norte em si, não o yuan ou aço de empregos americanos.

A China não ganha se Coreia do Norte desestabilizar o sudeste da Ásia, ou começar uma corrida armamentista regional que leve Japão e Coreia do Sul a construir suas próprias armas nucleares. Trump deveria tranquilizar seus aliados em Tóquio e Seul que permanecem sob a proteção do tio Sam, mas também deveria lidar com as preocupações da China.

Para este fim, poderia esclarecer  que seu objetivo é congelar e então reverter o programa nuclear do Norte, em vez  da mudança de regime. Pode ainda garantir que, se o Norte cair nos braços do Sul, a América manteria suas tropas ao sul da atual fronteira Norte-Sul. A China odeia a admitir que a dinastia Kim pode não durar muito, mas não é precipitado fazer planos para esta possibilidade.

A mensagem crucial para Kim, tanto como foi para seus antecessores, é que, se usar suas armas nucleares, o regime será reduzido. A longo prazo, a reunificação é inevitável e desejável. Enquanto isso, o Deus-Rei Júnior pode ser dissuadido.

*Tradução livre do blog

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