domingo, 30 de outubro de 2011

Barack "Kissinger" Obama, o presidente voltado para políticas externas

Por Thomas Friedman (New York Times, reproduzido no UOL, 28/10/2011)

Quem teria previsto isso? Barack Obama acabou se mostrando mais favorável à implementação da política externa de George W. Bush do que o próprio Bush. Mas Obama demonstra menos entusiasmo no que se refere a implementar a sua própria política externa. Os motivos, porém, são óbvios.

Da sua maneira própria, Obama fez com que o país adotasse a estratégia correta para a “guerra contra o terrorismo” de Bush. Essa estratégia consiste de uma combinação séria e focada de coordenação de inteligência global, assassinatos premeditados de terroristas conhecidos e intervenções limitadas – como na Líbia – que mobilizam forças populares e aliados, bem como um uso ponderado do poder dos Estados Unidos, de forma a manter os custos e os riscos em um nível baixo. Na Líbia, Obama salvou vidas e proporcionou aos líbios uma oportunidade de construir uma sociedade decente. Cabe a eles agora decidir o que irão fazer com essa oportunidade. Eu ainda estou cauteloso, mas Obama desempenhou o seu papel de forma excelente.

Não há dúvida de que George Bush e Dick Cheney acreditavam que tanto o Iraque quanto o Afeganistão iriam se constituir exatamente nos alvos dessas operações focadas e limitadas. Porém, as campanhas militares nestes dois países acabaram lembrando mais uma hipoteca subprime – uma pequena entrada e uma enorme dívida a ser paga em cinco anos.

Eles achavam que seriam capazes de “transferir” a casa antes que chegasse a cobrança. Mas, em parte devido à incompetência e à falta de planejamento daquela dupla, foi necessário muito mais tempo do que se esperava para transferir a casa para os novos proprietários, e o preço pago pelos Estados Unidos foi enorme. A campanha do Iraque ainda poderá ter um bom desfecho – eu espero que sim, e isso seria importante –, mas mesmo se aquele país se transformar em uma Suíça, nós pagamos um preço caro demais.

Portanto, sejamos claros: até o momento, como comandante-em-chefe na guerra contra o terrorismo, Obama e a sua equipe de segurança nacional têm sido muito mais inteligentes, duros e financeiramente eficientes na tarefa de manter o país seguro do que os “adultos” que eles substituíram. Os republicanos não chegaram nem perto, e é por isso que os veteranos do Partido Republicano têm tanta dificuldade em admitir isso.

Mas, embora Obama tenha se mostrado talentoso em implementar a política antiterrorista de Bush, ele tem tido menos sucesso quanto à sua própria política externa. A política de Obama para o conflito árabe-israelense tem sido um desastre. As suas esperanças de encontrar uma solução para a questão do Irã naufragaram, bem, nos rochedos do Irã. Ele pouco se empenhou em criar uma coalizão multilateral para fortalecer o Despertar Árabe, em países como o Egito, a fim de lidar com os desafios pós-revolucionários.

A sua decisão de assumir um risco extra no Afeganistão poderá se revelar fatal. Ele está mergulhado em uma guerra de palavras com o Paquistão. A sua política relativa ao clima global é marcada por uma invisibilidade embaraçosa. E os frios e calculistas chineses e russos, embora de vez em quando lhe ofereçam um petisco, buscam os seus próprios interesses, tendo pouca consideração pelas preferências de Obama. Por que isso está ocorrendo?

Bem, eu vou defender Obama, e não condená-lo. É verdade que ele foi ingênuo ao achar que o seu poder de estrela, ou o da sua secretária de Estado, faria com que outros países nos apoiassem incondicionalmente. Mas as frustrações de Obama no que se refere à criação de uma política externa de grande magnitude e não militar estão enraizadas em um problema social bem mais amplo – uma política que também explica o motivo pelo qual nós não produzimos nem um só secretário capaz de mudar a história desde a época dos titãs da Guerra Fria, Henry Kissinger, George Shultz e James Baker.

A razão para isso é que o mundo se tornou mais caótico, e os Estados Unidos perderam a sua influência. Quando Kissinger estava negociando no Oriente Médio na década de setenta, ele teve que persuadir apenas três pessoas a firmar um acordo: um todo poderoso ditador sírio, Hafez Assad; um faraó egípcio, Anwar Sadat; e uma primeira-ministra israelense que contava com uma maioria esmagadora no parlamento, Golda Meir.

Para fazer história, Obama e a secretária de Estado Hillary Clinton, de forma contrastante, precisam extrair um acordo de um regime sírio que está desmoronando, de um regime egípcio que desmoronou, de uma coalizão israelense fragmentada e fraca e de um movimento palestino cindido em duas partes.

Os Estados Unidos sequer se dão mais ao trabalho de negociar com o fraquíssimo governo civil do Paquistão. Nós nos dirigimos diretamente às forças armadas do país, que só desejam perpetuar o conflito com a Índia – e tirar proveito do Afeganistão como um trunfo nessa guerra – para justificar o interminável consumo de tantos recursos do Estado por parte do exército paquistanês.

“Fazer história por meio da diplomacia é algo que depende de fazer acordos com outros governos”, diz Michael Mandelbaum, especialista em Política Externa da Universidade Johns Hopkins (e coautor, comigo, do livro “That Used to Be Us”). “Mas atualmente, para fazer tais acordos, nós temos de fato que criar governos com os quais desejamos negociar – e não é possível fazer isso.” De fato, em diversas áreas problemática atuais, nós precisamos criar nações antes de fazer diplomacia. Uma grande quantidade de Estados que nasceram devido à Guerra Fria está fracassando.

E, no caso de Estados mais fortes – como a Rússia, a China e o Irã –, nós temos menos influência porque influência é, em última instância, uma função do poder econômico. E, embora várias companhias norte-americanas ainda sejam vigorosas, o nosso governo está mergulhado em dívidas. Quando uma nação se encontra tão profundamente endividada quanto nós nos encontramos – uma situação na qual profundos cortes das despesas militares são inevitáveis – o seu latido é sempre mais forte do que a sua mordida.

A melhor maneira de obtermos influência em relação à Rússia e ao Irã seria adotar uma política energética que reduzisse o preço e a significância do petróleo. A única forma de obter influência em relação à China é aumentar a nossa poupança e o nosso índice de graduação de estudantes universitários – bem como exportar mais e consumir menos. Mas nada disso faz parte do jogo atual.

Portanto, mamãe, diga ao seu filho que quando crescer não se torne um secretário de Estado ou um presidente voltado para políticas externas – pelo menos não antes que outros países construam mais nações no exterior e nós nos empenhemos mais em construir a nossa própria nação.

Tradução: UOL

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