quarta-feira, 19 de julho de 2017

O escorpião Temer

Por Murillo Victorazzo

Com a ascensão de Temer à Presidência após as corruptas gestões petistas, alguns na sociedade e imprensa cogitaram a formação de um "ministério de notáveis". Seria um gesto de estadista do comandante de um governo de "união nacional". Faria bem ao país, polarizado cada vez mais desde 2014, e à biografia do discreto constitucionalista. Se não por princípios, pela necessidade de conquistar credibilidade.

Dizendo-se surpresos, logo viram na Esplanada e no 3º andar do Planalto o que há de mais fisiológico e corrupto no país há mais de 30 anos: seu círculo íntimo de colegas peemedebistas, um a um alvejados por escândalos antes, durante ou depois de suas passagens pelo governo atual. Alguns presos, outros investigados.

Ameaçado de perder agora o cargo e tornar-se ele próprio réu por corrupção, Temer abriu o balcão de negócios com parlamentares, indo de encontro à austeridade defendida em discursos e leis reformistas. Fragiliza assim a equipe econômica, seu único esteio no mercado e entre agentes produtivos, em um momento em que ela decide por aumento de impostos.

Não bastasse, a fim de evitar o fortalecimento de Rodrigo Maia, em cujas mãos está a sessão que votará a denúncia da PGR e que pode vir a ser seu sucessor, não hesitou em ignorar o papel que lhe cabe como chefe de Estado. Governante apoiado por uma base composta por inúmeros partidos, em grande lambança, tentou aliciar parlamentares "socialistas" para o seu PMDB, causando irritação no parceiro DEM, que negociava com eles.

"Não é atitude que se espera de um aliado", afirmou o líder demista na Câmara. "Ele agiu como presidente de partido, não do país", reagiu o presidente da sigla assediada.

Ano passado e hoje, Temer nos remete à velha fábula do escorpião, aquela sobre o aracnídeo que, mesmo dependendo do jacaré para chegar à outra margem do rio, ainda no meio da travessia lhe dá uma picada mortal - mortal para ambos. Em outras palavras, não adianta, a natureza do animal sempre falará mais alto, mesmo quando o prejudica.

Ex-presidente do PMDB, Temer é a personificação da legenda, o exemplo maior do político pequeno em estatura moral e política - no sentido bom da palavra -, mas gigante como burocrata de máquina partidária, fisiológico em essência. Esta sempre foi sua natureza: o escorpião do atraso, que tenta se sustentar como novo para sobreviver. Mas começou a picar. Se o naufrágio não vier com a denúncia, ficará boiando em agonia pelos esgotos do poder até dezembro de 2018.

E os que projetavam algo diferente e agora se mostram atônitos, ou vivem em algum mundo paralelo onde se acordou para política apenas a partir de 2014, sem olhar para trás, ou são... deixa pra lá. Vocês concluam.

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