sábado, 6 de novembro de 2010

O Mundo Segundo Dilma

Por Maurício Santoro (http://todososfogos.blogspot.com/2010/11/o-mundo-segundo-dilma.html )

A política externa não foi um tema de discussão relevante na eleição presidencial brasileira, mas será importante para o governo Dilma. A economia internacional é cada vez mais relevante para o Brasil, pelo peso crescente do comércio exterior no PIB, pelas discussões sobre a guerra cambial e a reorganização do sistema financeiro internacional (G-20, Basiléia 3 etc). Além disso, o país articula iniciativas com as outras potências emergentes e precisa permanecer atento para as crises e conflitos na América do Sul, algumas das quais envolvem nações das quais depende sua segurança energética (Bolívia e Paraguai). O que se pode esperar da diplomacia brasileira sob Dilma?

Durante a campanha, a revista “Política Externa” enviou aos principais candidatos perguntas sobre sua plataforma diplomática. José Serra não respondeu – omissão curiosa, pois é uma publicação com muitos intelectuais do PSDB entre seus principais colaboradores. Marina Silva destacou pontos ligados a Meio Ambiente e Direitos Humanos. E Dilma apresentou opiniões que basicamente mantêm as diretrizes atuais. Perfis da presidente eleita com freqüência destacam sua pouca experiência internacional e concluem que dará menos ênfase à diplomacia presidencial e se afastará de negociações controversas, como os esforços de mediação da crise iraniana.

Contudo, as próprias transformações do Brasil apontam para mudanças. As indicações são de uma política externa mais complexa, menos centrada na Presidência e no Itamaraty e mais ramificada por outros órgãos do governo: ministérios econômicos, Defesa, área social, BNDES, empresas controladas pelo Estado, como a Petrobras, ou aquelas nas quais ele possui golden share, como Vale e Embraer. É a conseqüência inevitável da combinação de crescimento econômico, estabilidade política e maior engajamento nas redes globais de comércio e investimento.

Quem melhor capturou este novo quadro foi o jornalista David Rothkopft, da revista Foreign Policy. Em ótimo texto, ele chama a atenção para a necessidade dos Estados Unidos pararem de tratar o Brasil dentro do contexto de uma política geral para a América Latina, e abordarem o país numa esfera mais ampla, como um interlocutor para os principais temas internacionais, sobretudo em assuntos ligados à economia. Dito de outro modo: política externa é cada vez mais relevante para o Brasil, independentemente do interesse pessoal mais ou menos intenso do chefe de Estado.

Além disso, há outro ponto que tem sido deixado de lado pela maioria das análises: o modo como a diplomacia de perfil globalista de Lula reforçou a identidade de esquerda do governo, por sua ênfase em cooperação sul-sul e parcerias com potências emergentes. Haverá expectativas e cobranças do PT e de outros partidos progressistas da coligação para que essa linha diplomática continue ou se aprofunde, sobretudo diante dos impasses da liderança dos EUA e da União Européia, devido às suas crises atuais.

Também estou curioso para ver como duas mulheres e presidentes latino-americanas enfrentarão um desafio parecido: provar que têm capacidade de liderança própria. A relação Argentina-Brasil sob Cristina-Dilma promete, inclusive pela força da história de vida da mandatária brasileira para o vizinho que tanto sofreu com ditaduras militares.

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